quinta-feira, 28 de abril de 2011

De corpo e água

Piso no que resta de consolo. Vou pisando. Para ver se floresce. Desvio do que parece inevitável, do obscuro, traiçoeiro, molhado. Vou desviando. Enquanto piso. Para ver se ando.

Sem muitos rodeios encontro o indesviável, as ondas que escondem buracos e regam pés de humanidade. Os pés de todos nós, mesmo dos que não pisarem diretamente nas águas das ruas. Águas que não pertencem. Estão. Sempre transitoriamente. Hora nas nuvens, hora no chão. Vem e vão.

Num instante o piso vira poça, rio, lagoa e das águas faço chão. Para ver se ando. Para ver se chego. E me entrego às ondas que trata rua e calçada com igualdade, não as diferenciando em nada. Não vejo meus pés no chão. Não vejo mais.

Sinto. O molhado de tudo, o barulho do remar dos pés. Sinto fundo. Sinto muito. A ironia de continuar me protegendo da água que vem de cima. Sombrinha. O pouco de concreto onde posso segurar, ainda que não me segurar. E sigo.

As ondas já não importam mais quando se está molhado. Enquanto piso o importante é andar para ver se chego. Para ver se vejo novamente meus pés no chão.

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