terça-feira, 25 de maio de 2010

Regue-me

Eu treinava olhá-lo pelos olhos enquanto ele me rodopiava entre os dedos feito iô-iô. Olho no olho é tensão quando os lábios não dizem sim. Então sorrimos. Por que não? Era nossa permissão impensada em meio a tantas outras permissões que negociávamos naqueles momentos. Num nada de burocracia, tudo fluiu. Não me ocorreu pensar enquanto guiada por aquela correnteza. Generosa, deixava-me senti-la em cada gota: batia, sorria, voltava e de novo seguia o curso que a música pedia. Suas curvas sabiam como me segurar; deixavam-me dançante, mas não me deixavam escapar - talvez porque eu mesma não quisesse. Aquela correnteza me levava (e eu deixava) para o lugar que fosse. Eu só queria saber se ela me rodearia. Fez mais, muito mais: me abraçou um abraço de dar fôlego e não quis me decifrar. E nos seus olhos lembrei de como seu toque me oferece água para florescer, não para me afogar.

sábado, 8 de maio de 2010

Sentidos sentidos

Quem disse que seria fácil? Essa pergunta me passa a ideia de que para ser bom e agradável precisaria ser constante e estável. Sinceramente, não sei por que temos essa impressão; de que felicidade é sorriso no rosto o tempo todo.
Eu posso chorar e ser feliz, posso duvidar e ser feliz, me incomodar e ser feliz, me machucar e ser feliz, cair e ser feliz, errar e ser feliz, saber da imperfeição que a vida é e ser feliz. Posso sorrir e não me sentir feliz.
Felicidade é aproveitar essa potência que nos atravessa e ao mesmo tempo de nós emana. É sentir que nenhum adjetivo faz jus às experiências da vida. É ver que não faz sentido classificar a vida em parâmetros dicotômicos. E rir do absurdo que a palavra pode fazer com nossa existência. Felicidade é justamente curtir o que escapa à palavra, é viver no indizível. Felicidade para mim é vida. Mas não racionalize, sinta.
A palavra não chega lá, não adianta. Não dá para exprimir o que pulsa na minha carne doída de possibilidades, de beleza latejante. Posso dizer apenas que há dor, da felicidade/vida que não pode ser transmitida, do sentimento-toque que não pode ser compartilhado. Daquilo que precisa furar, penetrar, atravessar e fazer-se sentir em cada um; daquilo que só se pode cercear; do processo. O que está no entre, a dinâmica. O que está por todo lado, mas em nenhum lugar. O imaterial que toca apenas os sentidos, mesmo em (e justamente por) sua impalpabilidade .
Territorialidade, rede, vida. Concerto. Eco. Harmonia.