domingo, 23 de outubro de 2011

terça-feira, 19 de julho de 2011

Caçada ao Tesouro

Lambi os beiços. De arrepio. Meus olhos sempre tão arregalados não sabiam como se abrir mais. Você, ao meu redor, em mim, palpitando meu medroso coração... Você é bom nisso, Sr. V. Bom em chutar meu receio para escanteio e me puxar para dançar. Só você sabe tirar som do meu silêncio, ao me deixar sem ar. A gente se olha para se enxergar.

Eu tinha medo dos outros verem o que a gente enxerga quando se vê, mas não tenho mais. Nos seus olhos, enxergo o que eu quiser. Não queremos espelho ou atenção. Queremos contorno. Mas isso a gente não enxerga, Sr. V., sente. Como o calor do seu toque fazendo-me lembrar de mim quando me perco em você.

domingo, 3 de julho de 2011

Castelo de Cartas

Por favor, aproxime-se mais do que de mim o afasta. Frequente os lugares que deixei de ir. Esqueça que um dia minha falta sentiu. Sorria com quem não seja eu. Apareça quando eu longe estiver. Afaste-se do meu entorno. Apague minha ausência. Triunfe sem mim.

Por favor, faça-me acreditar que isso é o que sempre quis de você.
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Fotografia: João Chagas.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

100tidos

Senti dó.
Senti dor.
Sem ti,
Tem sido,
Sentido.

Senti dó.
Sem ti,
Dor.
Tem sido
Sentido,
Sem ti.

Se te dou
Ou de ti sou
Tem sido
Sem ti
que vou.

Senti que vou.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

De corpo e água

Piso no que resta de consolo. Vou pisando. Para ver se floresce. Desvio do que parece inevitável, do obscuro, traiçoeiro, molhado. Vou desviando. Enquanto piso. Para ver se ando.

Sem muitos rodeios encontro o indesviável, as ondas que escondem buracos e regam pés de humanidade. Os pés de todos nós, mesmo dos que não pisarem diretamente nas águas das ruas. Águas que não pertencem. Estão. Sempre transitoriamente. Hora nas nuvens, hora no chão. Vem e vão.

Num instante o piso vira poça, rio, lagoa e das águas faço chão. Para ver se ando. Para ver se chego. E me entrego às ondas que trata rua e calçada com igualdade, não as diferenciando em nada. Não vejo meus pés no chão. Não vejo mais.

Sinto. O molhado de tudo, o barulho do remar dos pés. Sinto fundo. Sinto muito. A ironia de continuar me protegendo da água que vem de cima. Sombrinha. O pouco de concreto onde posso segurar, ainda que não me segurar. E sigo.

As ondas já não importam mais quando se está molhado. Enquanto piso o importante é andar para ver se chego. Para ver se vejo novamente meus pés no chão.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Relógio

Ouço o tic-tac constante deste troço irritante que me encara indiferente. Na verdade ele é uma Monalisa mal dissimulada que nem sei se sabe ser o seu canto de uma uniformidade descabida. Só o que resmungo entredentes é um "vê se me esquece", um "vê se se atrasa" ou mesmo "vê se se perde".

Mas para quê pensar nisso se não faz diferença, é uma grande perda de tempo? A questão é: não importa e pronto. Passemos para outro ponto.

Não passo. Não caio mais nessa, argumentos são questão de crença. E a minha é crer que faz diferença persistir nesse ponto. A real perda de tempo é cair nesse discurso homeopaticamente diluído a partir de um veneno chamado otimização. Recuso-me a cair nas suas armadilhas socialmente aceitas. Essa palavra, um completo espetáculo travestido de demanda do mercado, é uma comercial formosura estética. Otimização; a palavra que convence e que compacta o tempo a vácuo.

E é sobre esse tempo que quero falar, o que quase foi sabotado aqui por palavras traiçoeiras que insistem em dizer "passemos a outro ponto". E persisto: não. Porque trato aqui do tempo onipresente, do qual os meus e os seus relógios são uma bem bolada metonímia. Uma dita quarta dimensão aprisionada nos ponteiros da eficácia impausável.

E sigo aqui discorrendo sobre os meus relógios. De fato anseio por sua morte súbita diariamente. Sou malvado, mas justo. Nem se esse troço parasse seria útil! Não me faria sorrir nem sentir meu tempo menos curto. Essa ironia do tempo é um insulto. E pior: não ser útil não implica ser inútil. Confuso. Mas pensar o tempo é parar de enquadrá-lo em extremos. Assim, vejo meus relógios como naturalizadamente cruciais. O tempo é fato, nada mais. Acho que isso resolva dúvidas aparentemente paradoxais.

O problema é que não importa se esse ou aquele, meu ou seu, de todos ou de ninguém, enfim, não importa quantos ou quais geringonças tic-taqueantes enfartem. O tempo não pára! E esse tic-tac agoniante de útil é no máximo inútil quando trava, atrasa ou brinca com minha cara. E, voltando ao paradoxo, concluo: relógios saltam de um extremo a outro sem em nenhum deles se encaixar. São fato, nada mais.

Não importa se eles se revoltem. Simplesmente, se os meus ponteiros param afetam o meu mundo, a minha vida independente de cidadão trabalhador inserido numa sociedade capitalista-burguesa-católica-apostólica-romana, totalmente dependente dos segundos facilmente controláveis pela tecnologia otimizante do meu relógio de pulso obviamente digital.

Caso meu aparato medidor de tempo resolva tirar folga e de quebra atrapalhar o meu trabalho, para o meu infortúnio só o meu mundo será afetado. Eu que me ferro, nada mais. Pois sejam quantos outros relógios mais resolvam tirar folga, não muda nada no total. Existem incontáveis outros para cobrir a escala de um tempo estranhamente inventado e há muito entranhado nos genes, do mundo, sociais.

O tempo, a espécie hors concours, é a que guia enquanto finge dar ao homem todo o poder de sua "autonomia". Será que ninguém vê? Ele é, da Seleção Natural, a chefia! O mundo é dos mais bem adaptados. Disso eu já sabia, mas é bom lembrar que talvez essa espécie não seja a minha.

E o meu relógio dos diabos apita: tempo esgotado. Estou atrasado para voltar ao mundo do trabalho.

E viva a evolução!
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Texto escrito em 23.04.09.

sábado, 12 de março de 2011

Primeira vez

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Este texto contém trilha sonora (música: "Without a name" - Clan of Xymox). As imagens do vídeo em questão nada tem a ver com esta postagem. É a música que importa aqui. Apertem play e desfrutem a leitura.
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Ele abria a porta, chegando em casa depois de um longo dia de trabalho. Cansado e sem pensar atirou-se com pasta, terno e gravata ao chão, tentando evitar que o segundo fosse pequeno demais. Sua mão conseguiu chegar a tempo de evitar que a cabeça da morena que caía do sofá tocasse o chão com toda a força do acaso.
A respiração pesada da pressa o fazia esquecer a perna que batera com brutalidade na mesa de centro, cheia de pó, vodka e cigarro. E na ânsia de não tentar entender nada, espantava às pressas o cabelo que escondia a face dela. A pele de um branco veludo-vampiresco, mas não assustador, o fez arregalar de susto mesmo assim. O negro do cabelo escorrido resvalava como água pelos dedos dele que a salvara.
Por um instante ele pensou ter entrado pela porta errada, mas não quis sair do chão para averiguar. Dali a mobília era realmente a dele, embora aquela bela adormecida não. Mas agora seria, pensou ele num piscar de clareza e olhos. Ela agora começava o abre-e-fecha de pálpebras até que conseguisse enfim enxergar os olhos que a olhavam fixamente. Um espanto passageiro tomou o rosto dela, até que de golpe abriu-se um sorriso tranqüilo com um fechar de olhos. Como uma gata em deleite após uma tigela de leite, ela suspirou e esticou-se enquanto se contorcia num espreguiçar contra o chão, o que fez os dedos da mão dele estalar entre a cabeça dela e o tapete. Ele fez cara de dor; ela não viu. E foi tão rápido o puxão em seguida, que ele na dor não conseguia mais pensar.
Ela já o havia tomado em suas mãos com o desejo insano do qual ele só vira um lampejo enquanto se via puxado por ela. Agora em sua boca, ele sentia o sabor da mistura que estava sobre a mesa. E do corpo dela podia sentir o cheiro de talco, enquanto se livrava de seu casaco e gravata. O beijo, início do que não acabaria tão cedo, era vermelho que borrava sem contorno a boca daqueles dois corpos magnéticos de suor e desejo.
Com as costas dela sobre o chão, ele a tomava por inteiro. Distribuía sobre a pele dela, sua boca em lampejos. Ele descia por ela, que elevava a cabeça em sorrisos e gemidos. Ele a rasgava a roupa e ela respondia estourando com força os botões da camisa que, dele, despia. Com a mão esquerda ele erguia, dela, tornozelos ambos, até que apenas costas e braços se mantivessem no chão. E com dentes e carícias ele retirava a calcinha pura de algodão, enquanto ela ofegava e apertava com unhas rosadas, o grosso tapete sobre o qual repousava inquieta.
E assim que terminou de desnudá-la, tornou a subir para beijá-la. E naquele curto espaço em que estavam, entre o sofá pardo e a mesa baixa, ela o revirou e logo por cima dele já reinava. Com o golpe certeiro de uma mão só, abriu a fivela do cinto que ele usava. E com dentes famintos avançou sobre o couro, puxando-o e fazendo-o gritar de atrito. Mas tudo que via aquele homem que agora arqueava, era a faísca do olhar de lince que ela o lançava. E continuava a fazê-lo enquanto abocanhava agora o botão da calça. E ele a acompanhava num oscilar entre o olhar dela e o desabotoar da calça, a fim de não perder nada. Mas o que o prendia era a língua dela contra os dentes, empurrando o botão que ora sumia entre lábios e selvageria e ora escapava da mordida; o mesmo botão que atravessava agora a fenda que o prendia. E o descer do zíper ampliou brutalmente a abertura.
Ela então despiu aquele mundo com a velocidade das mãos e fitou a cueca boxer dele com mistério. A superfície era tentadora para ela, que ao contrário de avançar como vinha fazendo, adocicou o rosto numa expressão de ternura. E assim ela deslizou o corpo nu no corpo dele, até descer e repousar em seu peito. A cabeça dela abrigava o som da vida dele, que acelerava. E de onde ele estava, começou a acariciá-la as ancas e a gostar da bela agonia de seu movimento. Ela as erguia involuntariamente, apoiando joelhos e mãos no chão, deixando que as pernas dele se abrigassem entre as dela. E assim ela se erguia enquanto mantinha a cabeça baixa, deixando a ponta de suas mechas uniformemente negras arrepiarem o peito dele. E, ele, vendo-a em ascendência da nuca à bunda, podia senti-la deslizando sua cueca para longe de si.
O braço dela, então, esticou-se até o assento do sofá e dali retornou com uma camisinha em mãos. Com a facilidade dos dentes, ela abriu o pacote com a navalha do prazer, pegou o conteúdo e cuspiu a embalagem fora. Abriu um sorriso ao notar o quanto aquele homem palpitava, segurou a ponta do preservativo e não tardou a desenrolá-lo sobre a grossa fervura. Em seguida, degustou sua obra de arte num rápido movimento que o faria querer mais. Cereja, ela pensou.
Ele de repente a pegou nos braços num puxa-empurra ininteligível de quem tanto ofegava e a pôs novamente de costas ao chão. Ela perdeu o ar e mais ainda quando o sentiu afastando suas pernas com a tensão do limite. E assim ela notou a pressa que o tomava e o faria acelerar tudo. O pavor a tomava.
Começou a empurrá-lo para longe e a fechar as pernas em defesa, mas ele não conseguia percebê-la. E por mais que a estivesse fitando o rosto, não enxergava o desespero de sua forma, o que a desesperava ainda mais. Ele não a prendia, porém também não a soltava. Até que ela o esbofeteou a cara e o fez despertar do transe. E enquanto ele se doía ao chão, ela saía deixando tudo para trás. Foi a primeira vez que ela deixara escapar uma vida.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

De Impronunciável


Tenho um silêncio pra dizer, mas não consigo que as palavras se calem.
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Fotografia: João Chagas.

domingo, 30 de janeiro de 2011